segunda-feira, 24 de março de 2008

A ilha


Numa ilha deserta.
É onde eu gostaria de estar. Para pensar, para me apegar a mim mesmo, para adquirir orgulho. Para me amar.
Vivendo por mim e para mim, sentindo a minha importância.

Eu definitivamente não valho muita coisa.
E ainda quero que gostem de mim. Impossível.
Como alguém pode conseguir se nem eu consigo?

Já tive essa sensação de fracasso antes, até mais intensa, mas acho que sou muito novo pra me sentir tão fracassado assim. Como pode?

Não consigo nada que do quero, meus sonhos, desejos, quereres, ambições, vão sempre por água baixo. Ta bom, é até exagero, mas nem tanto.

E lá vem mais uma decepção, mais uma dor.

Eu amo meus amigos. Queria ver em mim o que eles vêem.

Enfim, sinceras e humildes desculpas a Lady.
Fui apenas mal interpretado. Não foi aquela a minha intenção.

sábado, 22 de março de 2008

O Escritor e o Leitor




Era mais uma segunda daquelas em que ele saía de casa atrasado pra tomar o café na esquina. Ou pelo menos parecia ser.

E lá estava ele, com seu café e sua rotina.
Ali sempre passava um casal de velhinhos com um saquinho de milho nas mãos da senhora, iam até a praça onde ficavam abraçados dando milho aos pombos. Dois estudantes, um garoto e uma garota, passavam de mãos dadas rumo também à praça onde matavam aula. E quase na hora de ir para o trabalho um senhor passeava com o cachorro com toda elegância do mundo. Mas aquela manhã foi diferente.

Uma mulher de estatura mediana, cabelos vermelhos e longos, branca e usando um óculos com bordas azuis, passou em frente à padaria com toda serenidade do mundo, mas sem notar que dentro da padaria um rapaz a observava sem piscar os olhos, chegando até a entornar o café que bebia. Ela passou, e ele ainda a via. Depois disso não viu mais a senhora, não viu mais o casal de garotos e nem reparou que pisou em um objeto que o cão do senhor elegante deixou pelo caminho.

No trabalho não conseguia se concentrar. Só conseguia pensar naquilo que ele dizia ser, “a personificação do amor”. Tinha medo de que essa garota não fizesse parte da sua rotina constante. E quanto mais contava os segundos pra manhã do dia seguinte, mais longe parecia estar da manhã seguinte. “E se ela for comprometida?”, “e se ela não gostar de mim?”, “pior, e se ela for lésbica?”. Pensamentos assim sequer o deixaram dormir.

Finalmente, era manhã. E ele não se atrasou, pelo contrário, se adiantou até a padaria. Pediu o seu café como fazia todo dia, sentou-se no banco com a melhor vista pra rua. E lá veio o casal de velhinhos, o casal de garotos e o senhor elegante. Começou a se preocupar, e quando ia se virar para pagar o café, lá estava ela, a “personificação do amor”, e ele precisava saber seu nome, não conseguia se imaginar com ela na cama a chamando de “personificação do amor” ou “personificaçãozinha do morzinho”, era broxante.

Lá foi ele, todo atrapalhado, se aproximou tão rápido que ela ficou assustada. Não sabia o que dizer, não queria parecer mais um idiota que se aproximava dela pela beleza, porque sim, deviam haver muitos. Então resolveu começar pelo nome.

- Olá, qual o seu nome?

Ela lançou um olhar estranho pra ele, pensando se seria mais um idiota que se aproxima pela beleza, ou mais um desses caras que fazem cartões pra bancos.

- Roza, por quê?

Faz sentido que seja uma flor - ele pensou e conteve-se pra não dizer.

- Ah, você teve a ousadia de quebrar minha rotina passando por aqui, então eu precisava saber seu nome.

Roza se assustou mais ainda.

- E você acha mesmo que o mundo gira ao redor do seu umbigo assim? Falou em tom irônico.

- Não, você não entendeu bem. O mundo até que me fez um grande favor te colocando em minha rotina. Desde ontem que não penso em outra coisa que não seja te ver de novo. A gente acaba se conformando com uma rotina e quando avistamos coisas novas lembramos que o mundo é bem maior do que a vista do café na padaria.

Que cantada mais maluca. Bom, mas pelo menos foi original - ela pensou e quis ser simpática.

- Ah sim, e seu nome qual é?

- Eldis, prazer. - disse sorrindo.

-Prazer, Eldis. Agora já vou indo, preciso trabalhar - e virou-se.

- Ei, espere.

Ela se virou

- Diga.

- Pode me dar seu telefone?

Ela parou, pensou e disse num tom irônico mais uma vez:

- Claro.

Ele então pegou o celular e esperou ansioso que ela dissesse o numero.

Ela disse então o número e reparou que ele havia digitado “Roza” com s:

- Eldis, meu nome é com z – sorrindo.

- Com z? – assustado.

- Sim, acho que o cara do cartório era analfabeto. Mas acabou sendo legal, porque “rosa” com “s” tem aos montes já com “z” sou só eu.

- É verdade. O meu nome era pra ser Elvis e não Eldis, mas o cara do cartório havia bebido demais.

- Sério?

- Não. Mas eu gostaria que fosse.

Os dois riram até Roza interromper.

- Agora já vou indo, nos falamos quando você ligar. Até.

- Até.



E mais um dia de trabalho perdido. Além de ter chegado atrasado, estava ansioso demais pra se concentrar. Queria chegar logo em casa pra fazer a ligação. Chegou então em casa e foi direto ao telefone. Tocou, tocou, tocou e nada. No dia seguinte esperou na padaria se atrasando mais uma vez, e nada. E assim se manteve por semanas, agoniado, sem notícias, querendo vê-la.

De repente, se deu conta de que ela não daria o número para um estranho e desistiu. Ainda havia ali um fio de esperança, pelo seu lado sentimental, de vê-la, mas a razão o torturava dizendo que era o fim.

Então nunca mais ele...



Leitor:



Por favor, senhor escritor. Sei que meu papel aqui é de mero leitor. Mas devo interferir na trama e interceder por quem ama.

Dê a esse pobre rapaz o destino que quiser, mas prometa que no fim ele ficará com a mulher.




Escritor:



Me apaixonei pela arte de escrever exatamente por poder brincar de Deus. Quanto mais Deus me castiga, mais eu castigo meus personagens. Então deixe-me terminar do meu jeito essa história e recoloque-se no seu lugar.


Continuando:



Então nunca mais ele teve paz, depois que viu aquela Roza.

sexta-feira, 21 de março de 2008

O Rumo da Loucura


Acordei e eu estava aqui.
Os meus sonhos abstratos deram lugar á uma inundada e chocante realidade.
Eu sabia que aqui o meu inconsciente não tinha o que queria e por isso me torturava, me levando a cometer loucuras pelo seu prazer. Por conta disso eu fui perdendo o controle, o meu inconsciente travava uma batalha contra o meu consciente, era a razão contra os sentimentos. Eu era apenas palco pra isso tudo, a única forma de reagir seria atirar na minha própria cabeça, mas isso estava fora de cogitação, pelo menos por enquanto.
A razão estava fraca e o sentimento cada vez mais forte, meu corpo fervia, minhas atitudes eram infundadas, não me enxergava mais no espelho. Um cara nada teórico, sempre prático, capaz de fazer tudo pelos seus prazeres inconscientes. A razão, apunhalada, perdia muito sangue e agonizava aos poucos, até o seu último suspiro. E foi assim que eu enlouqueci.

Amigo de Imaginância


Volta a solidão, volta a imaginação.

Um Homem de cabelos longos e atrapalhados, trajando um macacão jeans desbotado, está sentado numa cadeira junto a uma mesa de madeira. No fundo, ouve-se a trilha do tédio, o barulho das gotas de uma torneira mal fechada, quando o homem finalmente dá sinal de vida. Ele se levanta, pega um envelope, uma caneta e uma folha de papel, coloca a mão sobre o rosto e começa a escrever:

Caro amigo;
Veio à saudade bater junto ao peito, depois de exatos 40 anos que não nos vemos.
Nossa amizade de infância foi algo que realmente marcou minha vida. Soube que ainda mora na mesma casa em que passei divertidos momentos com você, estou te mandando essa carta para avisar que te farei uma visita.
De seu amigo de infância, eternamente,
Thedy.

Ao terminar de escrever a carta o homem preenche corretamente os espaços do envelope e coloca a suposta carta dentro do envelope, cola o envelope com sua saliva e levanta, então ele abre a porta de casa, pára, e observa sua própria caixa de correios com a estranheza de quem nunca havia visto está, ele caminha em direção, abre a caixa, coloca o envelope dentro e fecha a caixa, volta para sua casa, deita em sua cama e dorme.

Na manhã seguinte, o homem levanta, abre um sorriso e sai da sua casa em direção a caixa de correios, ele abre a caixa e com a estranheza de quem nunca havia visto aquele envelope, o retira de lá com um sorriso no rosto. Ele carrega o envelope para dentro da casa, senta em sua cadeira, rasga o envelope, retira a carta e coloca o envelope sobre a mesa de madeira. O homem lê a carta com a estranheza de quem nunca havia lido tais palavras e então abre um imenso sorriso no rosto. Ele recoloca a carta dentro do envelope e coloca o envelope dentro de uma gaveta, senta de novo na cadeira e olha para cima, então ele bate com sua mão fechada debaixo da mesa de madeira simulando batidas em uma porta de madeira: “toc toc toc” e grita:
- Já vaaaai!
O homem levanta, abre a porta e abre lentamente outra vez o seu sorriso como se não acreditasse no que vê e diz:
-Não acredito que é você, Thedy!
Lá fora não se vê nada e então o rapaz abraça esse mesmo nada e convida esse mesmo nada para entrar:
-Entre, Thedy, Entre!

O Covarde


Estava descabelado, andava cambaleando e seus olhos vermelhos eram conseqüência das drogas e lágrimas daquela noite. Sua roupa social, sempre elogiada pelos vizinhos, estava desengonçada.
Finalmente chegou em casa. Soluçava e tremia enquanto tentava colocar a chave no buraco da fechadura. Depois de alguns segundos, finalmente conseguiu.
Ao dar o primeiro passo para dentro de casa deixou seu corpo cair, se contorcia no chão, chorava e soluçava.
Podia-se ouvir entre os seus choros e soluços:

- Pra que veio, amor? Pra que veio se não foi pra amar? Porque me tomou de tal maneira que eu não posso voltar?

Ele levantou e escorando na parede seguiu até o quarto, mais uma vez deixou seu corpo ir ao chão. Arrastando ele se aproximou de um armarinho onde pegou o telefone, digitou uma seqüência de números e aguardou soluçando que atendessem. Ao atenderem disse:

-O adeus que você me deu doeu, levou de mim o meu eu, minha vontade de viver, de seguir em frente. O adeus que te dou também doerá em você, mas esse não pelo amor, mas pelo remorso de não me amar, um remorso de uma coisa que na verdade sei que você não tem culpa.
Meu adeus é covarde, porque sempre fui covarde, não tenho coragem de viver assim. E só o fim é um alívio.
Adeus...


Ele então solta o telefone mesmo sem desliga-lo e segue se arrastando até o armário, abre a porta do armário e jogando todas as roupas ali presentes para fora, pega no fundo do armário um revólver, que lhe faz dar um tempo no choro, respirar fundo e admira-lo.
Escorando na parede ele levanta, coloca a arma na boca e atira.

Sem Sentido


Chegou a sua casa um pouco mais tarde que o horário de costume. Sua expressão abalada era conseqüência das reflexões durante o longo caminho do emprego até lá. Primeiro ligou a tv e abaixou totalmente o volume. Logo depois ligou o som e colocou um cd do Led Zeppelin no último volume. Acendeu um cigarro, pegou um cinzeiro e assentou-se.

Não sentia mais nada, pois o mundo estava menor ali. Não sabia que nesse mesmo instante um terremoto destruía o mundo. A terra tremia, mas ele não sentia, estava concentrado na fuga de suas reflexões. Não havia mais tv, não havia mais Led Zeppelin, mas ele estava distante demais pra perceber. Sua casa desabava, até mesmo atingindo-o, mas ele não sentia. Dentro do seu mundo o que havia era um grande branco contornando as verdades e mentiras que o abalavam. Os destroços ao seu redor não tinham sentido e se identificavam com ele. Isso justificava a sua vida enquanto todos daquele mundo já haviam morrido.

Quando já havia dado a volta em sua mente, despertou. Já não havia mais terremoto, somente os destroços, que já o tinham como amigo. Abriu os olhos, e viu um imenso nada.
Disse:
- Agora todo o meu egocentrismo faz sentido.
E então sorriu.